Recebi um delicioso convite do casal Antenor e Terê, amigos de anos da Universidade de São Paulo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), para participar do “Reveillon dos que ficaram” este ano. Como acontece todos os anos, os paulistanos sofrem uma debandada geral, quase migração compulsória como aves, em busca de melhores condições de temperatura e paz de espírito. E quem fica por aqui, tem mais é que se agregar. Logo que cheguei, já fui abordada pelas amigas que repetiam minha fala na TV Mexido “Meu processo de criação do Mexido…” e por aí vai. Os casais que lá estavam, ao contrario de mim, todos se conservaram arquitetos e hoje possuem renomados escritórios ou trabalham em órgãos de planejamento do governo.
Eu, desgarrada, encontrei meu ofício entre lentes, letras e panelas. O que me deixou intrigada foi a frase do meu amigo Newton Massafumi. “Precisamos conversar sobre café!”, ele disse enquanto degustava um rose italiano sentado no balcão da moderníssima cozinha Newton. O “Massa”, como era chamado na faculdade, tem um extenso curriculum. Sempre brilhante, ele é um dos fundadores da Escola da Cidade e possui um escritório premiadíssimo. Ele me contou que na década de 70, quando compartilhávamos os mesmos bancos da FAU , ficou “internado” durante meses na Fazenda Pau D’alho (orientado pelo arquiteto Luis Saia) para reconstruir o quebra cabeças que eram as ruínas da primeira fazenda a produzir café em escala industrial.
Contou-me sobre uma traquitana (engenhoca) para pilar o café, que tirou o sono de todos os envolvidos no processo de restauro. Tratava-se de diversos pilões enfileirados e uma engrenagem movimentava os martelos em cada um dos pilões. Quase que uma estrutura de teclas de piano, todos os martelos iniciavam o pilar do café num só movimento. Acho que era movimento de manivela. Um artífice marceneiro que acompanhava os arquitetos desvendou o quebra cabeças. Graças a ele, podemos admirar essa engenhoca singular durante a visita à Fazenda em São José do Barreiro, imperdível pra quem gosta de reviver nossa história.
O escritório do Newton também fez o projeto da cafeteria do Museu do Café em Santos. Segundo ele, este projeto foi uma continuidade no mergulho de conhecimento sobre essa cereja de café que compõe nosso bolo cultural. Tudo isso começou com Luis Saia, que faleceu 1975, mas foi um pioneiro na arte da preservação.
Esse ano começou bem, compartilhado com amigos que hoje percebo continuam contribuindo para a efetivação de nossas raízes. Obrigada por tudo, Luis Saia.
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